As declarações do Cardeal Patriarca a respeito dos casamentos de mulheres católicas com homens muçulmanos, que tanta celeuma estão a levantar, não têm nada de estranho por dois motivos:
- Em primeiro lugar, elas não são estranhas porque são um conselho de prudência perfeitamente razoável. De facto, qualquer mulher dever-se-ia preocupar em saber com que homem se vai casar, muçulmano ou não. Mas deverá estar ainda mais atenta se o homem tem fortes convicções religiosas. A menos que tenham especial prazer em ser tratadas como seres inferiores, as religiões em geral, as abraãmicas em particular e a islâmica em particular não lhes são muito favoráveis.
- Em segundo lugar, estas declarações põem em destaque que toda esta conversa acerca do ecumenismo é apenas uma capa simpática e vistosa para uma aliança contra o pluralismo moral e a laicização de facto que vivemos nas sociedades europeias. O cardeal tem toda a razão quando afirma que os muçulmanos só respeitam o cristianismo porque aqui estão em minoria. Deixemo-nos de discursos pseudo-conciliatórios e vejamos como são tratados os não-crentes ou os cristãos nos países muçulmanos. Veja-se o Líbano, o Iraque, o Irão, o Egipto, as monarquias da península arábica. Veja-se como os muçulmanos são uma infindável fonte de violência na Índia.
Podemos dizer que o problema não está no islamismo em si. Eu concordo. Todas as religiões são intrinsecamente exclusivistas e, por conseguinte, más. Estranho é que o cardeal diga que os muçulmanos não têm o direito de achar que a sua é a única verdade. Será que o cardeal subitamente aderiu ao relativismo? Será que não acha que a sua verdade é A verdade? Claro que acha e, tal como os muçulmanos, tem todo o direito de achar que a sua verdade é a única verdade. Como eu acho que a minha verdade é a única verdade. O que não temos é o direito de impor a nossa verdade aos outros. E é aí que as religiões falham rotundamente, e é por isso que elas são hoje a mais perigosa doença mental da humanidade.
O cristianismo não é melhor que o islamismo e se é mais tolerante que ele, é precisamente pelo mesmo motivo apontado pelo cardeal para os muçulmanos em Portugal tanto falarem no respeito da "cultura nacional" (o que quer que seja isso) e da "sua" religião. É porque a Igreja Católica, ainda que massivamente financiada pelo Estado, está social e politicamente em minoria. Porque a maior parte dos portugueses, se fosse honesta consigo própria, diria abertamente que de facto não é católica. Porque a esmagadora maioria dos portugueses intimamente sabe que jamais toleraria, nas condições actuais, que a Igreja lhe impusesse a sua agenda política tantas vezes escondida, mas cada vez mais revelada.