terça-feira, 30 de outubro de 2007

Sobre a necessidade da divindade

Uma das coisas que me despertou a atenção foi a alegada tendência para os seres humanos precisarem do sagrado; bom, se formos por aí então o Cristianismo tem realmente de ser todo revisto. Uma religião que desde o início não é mais que uma cambada de ressabiados em relação ao sexo - a coisa mais natural a seguir à fome, sede ou amor à vida - e que portanto se funda na repressão dos nossos instintos mais primários, dificilmente terá moral para falar em necessidade do sagrado.

Em boa verdade, o que era realmente bom é que homens como Dawkins não tivessem de se preocupar com os religiosos, ou seja, que os religiosos vivessem as suas fantasias sem incomodarem os outros. É porque a religião insiste em impôr-se aos outros que argumentações racionais em torno de um assunto não racionalizável (as divindades são irracionalidade pura, e provar a irracionalidade da falta de razão é tão degradante como irritante como ainda e mais prosaicamente um perfeito disparate) têm de surgir. É uma pena que mentes como Dawkins se tenham de ocupar de uma coisa tão óbvia.

O debate deveria centrar-se numa coisa mais simples, que é a de garantir em questões concretas princípios universalmente aceites como a laicidade do Estado ou a secularidade da sociedade - e não, por exemplo, a não-contaminação da ciência pela religião. Mais de dois séculos após o Iluminismo ainda estarmos à volta de algo tão básico é desesperante.

segunda-feira, 29 de outubro de 2007

Tudo bons rapazes

Picados pelo ritual do haka – caracterizado pelos gestos e gritos primitivos simulando o domínio sexual do adversário – com que foram prendados pelos colegas de licenciatura em Engenharia Informática (LEI) da Universidade do Minho –, os estudantes do Instituto de Engenharia Superior do Porto (ISEP) perderam as estribeiras quando um elemento do seu grupo foi atingido pelo spray de um extintor dos caloiros minhotos. “Entraram sete rapazes e uma rapariga aos berros e aflitos que se meteram aqui na oficina, e de seguida vi para aí 40 ou 50 tipos com garrafas, garrafões e matracas, aparentemente bem bebidos, aos berros e a quererem bater nos de Braga”, disse ao CM João Pinto, descrevendo o cenário ocorrido ao final da tarde de anteontem na sua oficina Copiauto.
Exaltados, os alunos do Porto chegaram a utilizar gás pimenta e provocaram vários danos em alguns carros. João Pinto chegou a temer pela vida dos universitários minhotos, que ficaram sequestrados. [...] “Foram momentos terríveis e de grande tensão. Parecia algo só possível de acontecer num filme. Uma grande confusão, dezenas e dezenas de alunos aos berros e a gritar sucessivas ameaças, com a polícia à mistura e as sirenes da ambulância. Mais atrás ainda havia gente com uns copos de cerveja e também alguns com garrafas de Vinho do Porto”, descreveu ao CM uma moradora [...].

Há umas duas semanas escrevi um post em que defendia que as praxes devem ser simultaneamente permitidas e fortemente reguladas, por forma a garantir que efectivamente existe liberdade de escolha. Isto implica que à liberdade de praxar deve corresponder a responsabilidade de praxar dentro de limites aceitáveis.
Tenho sérias dúvidas que uma turba de bêbedos armados pretendendo espancar meia dúzia de pessoas e destruindo propriedade alheia seja agir dentro de limites aceitáveis. A expulsão ou, pelo menos, a suspensão dos alunos em causa seria o mínimo que a universidade poderia fazer, já para não falar das reparações pelos danos causados, que teria de ser tratada a nível jurídico.
Esta foi a parte em que me indignei. A parte em que me rio é aquela em que os trogloditas praxantes simulam o domínio sexual dos oponentes. Para quem possa achar ridícula a comparação entre o sadomasoquismo e as praxes, aí fica a bofetada.

A escala europeia

Defendendo eu a iniciativa por um referendo europeu, só posso aplaudir o texto de Miguel Pacheco no Diário Económico:


não seria de todo descabido abrir o precedente jurídico de um referendo simultâneo à escala europeia. Com todos os problemas, desafios e vantagens que ele carrega. Desde logo, esse plebiscito global permitiria criar um efeito mobilizador à escala comunitária, minimizando os feudalismos - e sectarismos - nacionais contra a Europa. Ao mesmo tempo ajudaria a criar a ideia de que somos afinal todos europeus e iguais, passando um atestado de legitimidade às instituições europeias.
Claro que o peso de cada país teria que ser, naturalmente, corrigido na sua proporcionalidade para evitar desequilíbrios. Mas só assim as reticências holandesas e francesas passariam a ser uma gota de água neste oceano maior, onde a grande maioria aprova a ideia de uma construção europeia. 50 anos depois de Roma, seria um atestado de competência a este projecto. Claro que há riscos. E uma boa dose de idealismo nesta solução. Mas sonhar nunca fez mal a ninguém.

Haja mais opiniões neste sentido!

domingo, 21 de outubro de 2007

Um tratado remendado - Annemie Neyts da ELDR

Porreiro, pá! - ou como fugir em frente pela porta do cavalo

Há críticas relativamente justas que se podem fazer ao texto da constituição europeia. O seu volume assusta. Não foi feita de forma democrática. Mas tinha virtudes: sistematizava. Instituía princípios políticos basilares que definiam o que é em concreto ser europeu.
A desconfiança dos cidadãos holandeses e franceses face a um texto muito grande, alvo de um sem número de mistificações (que livremente puderam correr não só pela dimensão e ilegibilidade do texto como pela obscuridade que implica a sua escrita por um conjunto de iluminados politicamente irresponsáveis que ninguém conhecia, que não prestavam contas perante os cidadãos e que sobretudo, e isto é fundamental, foram político-burocraticamente nomeados e não democraticamente eleitos para o efeito) resultou num duplo chumbo.
Grande crise, a eurocracia treme, e agora pá, e agora pá? Ah, claro, vamos simplificar o texto. E assim foi. Os elementos que estariam na base do necessário aparelho simbólico da cidadania europeia desapareceram, os princípios foram rasgados em nome das leis laborais de Tatcher e do ultracatolicismo que não é bacoco apenas porque é demasiado perigoso de uma Polónia que esqueceu o seu passado ou se lembra demasiado do seu passado para se recordar do que ela poderia ser sem Europa e de ter sido o primeiro país europeu com uma Constituição moderna. E pouco mais mudou. A maioria (que não o essencial) do texto inicial está aí.
E vai passar, ser aprovado como sempre foi tudo aprovado nas comunidades europeias: o povo é estúpido e não sabe o que é bom para ele. Os governos, negociando fatias e migalhas de supostos interesses nacionais, vão fazer tudo pela porta do cavalo, dado que a resposta que anteriormente ouviram não lhes convinha. É uma fuga para a frente que se arrisca a ter como destino o precipício. Tinha sido daí que tínhamos fugido no princípio.
Ontem participei num debate de um magazine europeu online (Cafébabel.com) em que o redactor Fernando Navarro afirmava que é vital a existência (ou seja, a criação, e que só pode ser criação a partir de baixo) de uma opinião pública europeia. Ou seja, é fundamental haver um conjunto de pessoas que olhem para a Europa desde um ponto de vista europeu. Concordo e acrescento que só assim a Europa se irá corporizar, ser real, e só assim esta mistura pardacenta de governos e burocratas vai realmente começar a ser posta em causa. Houvesse uma opinião pública europeia e tudo teria sido radicalmente diferente: a constituição provavelmente seria elaborada por uma assembleia constituinte europeia constituída por deputados mandatados para o efeito e a ratificação far-se-ía por um referendo único europeu.
E não tenho dúvidas nenhumas que, se o processo fosse este, teríamos uma constituição que seria facilmente aprovada em todos (bom quase todos - o Reino Unido votará sempre contra, mas era da maneira que teria de sair da UE) os países europeus.
Termino com uma declaração de Medeiros Ferreira na Única desta semana "As questões da Europa só são discutidas nos cafés quando a imprensa, os políticos ou líderes de opinião os suscitam a falar e a pensar sobre determinados assuntos. De outra forma há, quando muito, uma reflexão adjacente à sua vida quotidiana." O problema é que os próprios governantes actuais, ao invés de se centrarem no tal ponto de vista europeu, preferem manter a discussão e a negociação nas questiúnculas comezinhas ou na alarvidade absoluta: os sítios onde as coisas são assinadas, aquele deputado extra ou se a pena de morte é uma coisa má ou não.

sábado, 20 de outubro de 2007

Millennium - recebido por e-mail


Se não tens pais ricos tens mesmo
de ir ao BES!

A criar excêntricos todas
as semanas!

terça-feira, 16 de outubro de 2007

Richard Dawkins entrevistado na Sábado

A ler, a entrevista de Vanda Marques na Sábado desta semana a Richard Dawkins, na sequência do lançamento da tradução portuguesa do livro The God Delusion pela Casa das Letras.

A respeito de reacções interessantes ao livro do autor, este blogue é interesante. O tipo de atitudes a que a Igreja nos habitua estão todas aqui. Por um lado, o autor afirma aqui que Agora o que sobressai é um apelo: que aqueles que falam em nome de Deus procurem aprender com Ele a paz. Chega mesmo a afirmar que estamos num mundo que está mal e que está cada vez mais sem deus. Curiosamente, essa afirmação restringe-se apenas a uma das poucas partes do mundo em que a tolerância ainda é uma regra - embora o ultracatolicismo instigado pelo Vaticano esteja a tentar quebrar a excepção através do exemplo polaco. Em todos os resto do mundo as religiões estão com um vigor como há muito se não conhecia. E como tem ficado o mundo? Menos pacífico, isso é pacífico. E será coincidência? De forma alguma. Dawkins explica porquê.
Ora, quem afirma que é preciso os crentes aprenderem a paz deveria, presumo, condenar todos aqueles que instiguem à violência em nome de deus, certo? Errado! Menção ao cardeal que apela à rebelião católica contra o Estado laico e à sociedade secular sem qualquer menção à frase que o mesmo proferiu e que quase despercebida passou.

Falso moralismo católico é uma expressão que cedo aprendi a dizer, depois de ter lido boa parte da Bíblia. E estes anos todos depois, continua a fazer o mesmo sentido que fazia no início.

Renováveis, para quê?


Preços do petróleo estabelecem novos recordes aproximando-se dos 88 dólares em Nova Iorque
Os preços do petróleo atingiram hoje novos recordes, aproximando-se dos 88 dólares por barril nos Estados Unidos, num mercado preocupado com as consequências de uma eventual ofensiva turca na fronteira iraquiana.

segunda-feira, 15 de outubro de 2007

Desenvolvimento Sustentável: da Ética Empresarial à Ética dos Consumidores

Bloggers Unite - Blog Action Day

(este post insere-se na iniciativa Blog Action Day pelo Ambiente)

*

Já que conhecemos os riscos do atual modelo de desenvolvimento, temos recursos e tecnologia e sabemos o que deve ser feito para alcançar a justiça social e cuidar do planeta, a opção pelo desenvolvimento sustentável depende apenas da vontade política dos governos e da sociedade. Ou seja, trata-se de uma escolha ética.
Manifesto pelo Desenvolvimento Sustentável / 2006 do Instituto Ethos

Parecem modelos perfeitos, mas são verdadeiros fracassos de vendas. Os consumidores europeus continuam a optar por versões mais potentes e não estão dispostos a pagar mais para terem meios de transporte energicamente eficientes.
Diário Económico

*****

Muitas vezes são as empresas criticadas por não desenvolverem produtos ecológicos ou por seguirem lógicas produtivas socialmente nefastas. No entanto, se realmente defendermos a liberdade e a responsabilidade deveremos, para além de inquirir as empresas, confrontar os consumidores com os seus actos e as suas opções. Não é justo nem benéfico utilizar as empresas como saco de boxe da má consciência global e por outro lado tratar os consumidores como se fossem crianças.

Os clientes, os consumidores, são a chave para alguns dos dilemas que se colocam no que respeita à exequibilidade da ética empresarial. Proliferam os rankings de empresas que são boas empregadoras, desenhados por instituições ou órgãos de comunicação; há também já múltiplos fundos éticos e até índices como o FTSE4Good, destinado a facilitar o investimento socialmente responsável e a aposta em empresas guiadas por uma gestão transparente. A ética do consumidor é a melhor contrapartida que pode haver para uma ética da empresa. À responsabilidade da empresa deve corresponder a responsabilidade do consumidor, que se deve preocupar em adoptar um consumo consciente e crítico face a políticas de contratação, higiene, segurança, transparência, honestidade no seio das empresas que produzem os bens ou fornecem os serviços que vai adquirir. De facto, muita da crítica ao capitalismo é uma crítica à democracia na medida em que é uma crítica à capacidade de escolha de cada indivíduo. A maturidade em todas as escolhas que efectuamos é decisiva para formatar os Estados em que vivemos, as sociedades em que nos movemos e os mercados que nos abastecem. Isto corresponde precisamente à prossecução do projecto iluminista numa época pós-convencional de, como Kant afirmou, sermos capazes de nos guiarmos por nós próprios, assumirmos o peso de sair da menoridade confortável a que o consumo automático nos restringe.

A ética do consumo não faz parte da ética empresarial – mas é a consequência lógica da mesma, uma exigência de justiça; movendo-nos no plano da ética e não do direito, a coação não pode ser jurídica. No entanto, a coacção moral num sujeito colectivo como é a empresa só pode dar-se através de algo tangível. O consumerismo (ético e ecológico) é a recompensa prática da empresa ética e a punição da empresa que se furta a ser responsável.

domingo, 14 de outubro de 2007

Rebelião contra a religião


Se alguém disser que defende uma rebelião contra a religião e as igrejas, será acusado de intolerância. Mas se o acontecimento for
Secretário de Estado do Vaticano apela à "rebelião" dos cristãos face ao laicismo
então a coisa passa relativamente despercebida.

sexta-feira, 12 de outubro de 2007

An inconvenient Prize


Há quem diga que este não é um prémio justo por dois motivos:
- Gore apenas fez o que fez para promoção pessoal
- o prémio é da Paz, não do Ambiente.

Eu apoio esta atribuição por vários motivos. Desde logo, não me interessa se ele fez o que fez para promoção pessoal ou por altruísmo. Aliás, é duvidoso que o ser humano aja por altruísmo na vida pessoal. É ainda mais duvidoso que o façamos assim na vida política.
Por outro lado, não perceber que o ambiente (os recursos energéticos, a água, os desastres naturais, a desertificação) ao mesmo tempo que é fonte de guerras actuais poderá vir a gerar cada vez mais guerras no futuro é não perceber nada, não apenas do presente ou do futuro, mas até do passado: devem contar-se pelos dedos as guerras que não tiveram como base a luta pelo controlo de determinados recursos. Com o declínio de alguns dos principais sustentáculos não só das sociedades modernas (petróleo, por exemplo) como da própria vida (água potável) há alguma razão para crermos que a situação vai melhorar?

Esta foi uma boa mensagem que foi passada pela Academia. Eu aplaudo este prémio inconveniente (que foi também atribuído ao IPCC).

E não vou falar que não estou a ver quem mais poderia receber um prémio Nobel da Paz neste momento.

quinta-feira, 11 de outubro de 2007

Esta juventude está perdida

Julgo que a proposta aprovada hoje neste plenário de estudantes candidatos ao primeiro ano e apresentada pela sua inter comissões de luta órgão que todos souberam erguer para poder fazer avançar a luta é uma proposta inteiramente justa e que conduz no sentido correcto da luta que é no sentido de ingresso imediato da sua aplicação desde já e de exigir das autoridades governamentais a legalização; pois nós temos que ver que esta questão da luta contra o serviço cívico, que já foi vista o ano passado e temos que seja quem for que está no ministério da educação e da investigação cientifica, chamemos-lhe assim, defende essa medida, medida essa que não é mais que o reflexo da crise do sistema de ensino burguês, e medida essa que é inteiramente incorrecta, anti operária e anti popular que lança estudantes contra trabalhadores e trabalhadores contra estudantes.

Aqui estão as competências linguísticas de um jovem universitário de classe média-alta, há 30 anos atrás e que teve toda a sua escolaridade ainda nos gloriosos tempos da Outra Senhora. Diga-se o que se disser a respeito do nosso sistema de ensino, em 30 anos avançámos muito. Gente um pouco mais ignorante haverá sempre, mas não só creio que não encontraríamos muitos universitários hoje capazes de dizer tantas asneiras como também acho que os que se equiparam hoje àquele grau de alarvidade se remetem ao silêncio.

E saber estar calado, tal como saber falar, é um sinal de sabedoria.

quarta-feira, 10 de outubro de 2007

O Youtube explicado à luz de Adam Smith


O ataque dos bambis assassinos


Num recente livro John Mueller, um académico americano, constata que o número dos seus concidadãos mortos por terroristas desde 1960 "é aproximadamente igual ao número de mortos no mesmo período em resultado de acidentes provocados por veados".

Fiquei incomodado quando li isto. Até este momento sempre tinha gostado de ver os veados no Richmond Park em Londres. Agora dou por mim a olhar para eles com suspeição e ressentimento. Naturalmente, devemos ser cuidadosos para não generalizar a respeito dos veados. A maior parte deles vive vidas pacíficas. Mas certamente que é loucura cegarmo-nos perante a ameaça assassina colocada por uma pequena mas fanática minoria da comunidade dos veados! Uma ideologia abominável alojou-se entre as suas armações. Eles parecem decididos a matar e morrer em prol de uma fantasia mortífera - regressar a uma idade de ouro em que os veados controlavam as florestas da Europa medieval.

Gideon Rachman, Financial Times 9 de Outubro

segunda-feira, 8 de outubro de 2007

Repensar o Centro

Ainda sobre este post, encontrei este artigo na wikipedia em que se fala do liberalismo social. O posicionamento a ele atribuído parece-me bastante correcto e corresponde exactamente àquilo que eu quis dizer a respeito do liberalismo.


Liberalismo como princípio ético: uma crítica aos "liberais clássicos" (conservadores economicamente liberais)

Classical liberals largely seem to miss the point that a man’s liberality is not determined by how low they want taxes to be, nor one’s belief in the working’s of markets, but has far more to do with the workings of mankind. If liberals believe in a free market, it is not because they believe that it is the greatest way to prosperity, but rather that it is because mankind is capable of embracing and making its own economic decisions.
[...]
And there we have the crux of the matter. So-called ‘classical liberals’ have themselves failed to understand what liberalism truly means by believing that economics and ideology are inseparable, or at most one and the same. They see the glorious days of Ricardo, Malthus and Adam Smith as the days of true liberalism, when it meant what it said on the tin. Free trade was the conventional wisdom, and the evils of government intervention were negligible. To them this is liberalism, a free market, a small government and the public sorting public problems out themselves. Many within our party (and even more so within the conservative party) would agree. How wrong they all are.
Liberalism has never been about method, it is about fundamental beliefs in humanity that human beings are capable of making their own decisions in life, that they generally know what is good and bad for themselves and society - and are therefore capable of taking economic, political and social decisions themselves - combined with distrust for traditional and powerful elites (whether aristocratic, governmental or corporate).
‘Classical liberals’ place all their liberal faith in economic beliefs and none in the social or political ones, believing they can dilute humanity down to economic self serving machinations. Let me ask one question: if people are so capable of making their own economic decisions, then why are they so incapable of making political or social ones?

John Dixon (jovem militante do LibDem e autor do blog A Radical writes...) em LibDemVoices

Repensar a Esquerda, o Centro e a Direita

Numa blogosfera em que dominam sobretudo os blogues ou mais à Direita ou mais à Esquerda (e em particular os primeiros), ter espaços como o Esquerda Republica ou o Margem Esquerda é sem dúvida positivo. Poderia referir outros blogues próximos desta área, mas fico-me pelo essencial para este post que vem na sequência deste outro e ainda de uma série de posts que foram escritos no Esquerda Republicana, a saber, Socialismo e Liberalismo partes I, II e III.

No Margem Esquerda encontramos a frase Talvez porque foram os liberais os primeiros a assentarem na margem esquerda da política.
No texto de João Cardoso Rosas, Há uma esquerda estatista e uma esquerda liberal. Também há uma direita liberal [...] e uma direita estatista.
No Esquerda Republicana lemos Deveria ser possível a pena de morte? É correcto impedir o consumo de drogas pesadas? E leves? A prostituição deve ser proibida? É legítimo controlar a entrada de emigrantes? A eutanásia deve ser proibida?Se respondeu "sim" a estas perguntas todas, não invente desculpas: o leitor não é um liberal. Se tem pena, porque gosta da palavra "liberal, pois fá-lo sentir-se um pouco rebelde, mas não gosta nada da bandalheira em que a "ditadura da liberdade" resulta, auto-intitule-se "liberal à la Pedro Arroja" para causar menos confusão.

Desde logo eu ponho uma objecção que creio não ser irrelevante à divisão que João Vasco faz, recorrendo à já normal divisão (mais sofisticada que a separação Esquerda/Direita) entre uma avaliação de posições económicas e sociais. Ele coloca todo o extremo libertário desde o ponto mais à esquerda até ao ponto mais à direita no campo liberal. A minha questão é que isto desvirtua o conceito. Se o liberalismo é isso tudo, então o que é?


Creio que pelo menos o anarquismo de Esquerda tem de ser subtraído desse campo. Resta como tratar os libertários de Direita, o que teoricamente pode ser uma questão encantadora mas em termos práticos é nula: está por nascer o homem ou mulher que conseguir honestamente colocar-se no extremo inferior de direita. No entanto e admitindo essa possibilidade, admitamos que serão os libertarians a ficar nesse canto, e por extensão todos aqueles que se reclamarem apoiantes e seguidores do pensamento de Friedman na sua integralidade (e não mantendo o libertarismo económico expurgando o libertarismo nos costumes).

Temos, portanto, os anarquistas e os libertarians nos extremos. Não é difícil perceber onde quero chegar. O liberalismo, que na esfera dos costumes se pode desenvolver ao longo de toda a parte inferior do eixo vertical, tenderá a colocar-se nas zonas centrais do eixo horizontal, seja mais à esquerda seja mais à direita.


A título exemplificativo vejamos a seguinte distribuição de resultados neste esquema de alguns filiados no único movimento político liberal português:




O resultado parece ser congruente com o que eu já tinha afirmado. Usando-me a mim próprio como cobaia, o resultado foi


Ao contrário do que tanto comunistas e afins, e conservadores e afins costumam afirmar, o liberalismo não é uma doutrina de Direita, mas sim de Centro. E de Centro não indiferentista, não baseado na gestão de interesses - isso é aquilo em que a social-democracia (ou socialismo liberal) e o conservadorismo moderado (ou conservadorismo liberal) caíram por cedência à realidade, ou seja, por terem de aceitar pelo menos parcialmente o liberalismo económico. A questão é que esta cedência implica uma corruptela da ideia que abre caminho a situações ideologicamente insustentáveis. Recentemente dei um exemplo (em Portugal) da incoerência social-democrata e dois exemplos (um americano e outro francês) da incoerência conservadora.

Muitas das considerações menos lisonjeiras que são utilizadas contra o liberalismo resultam desta confusão e desta mistura que esvazia o conceito de mercado da sua dimensão ética (o que implica direitos mas também - facto tão frequentemente esquecido ou vituperado à Direita - deveres) e o transforma numa luta despida de outros princípios que não o interesse pessoal imediato (o que implica que se eu puder roubar sem ser apanhado para obter mais ganhos, o devo fazer).


Muito mais importante é no entanto outra coisa. A própria conceptualização do gráfico da bússola política não permite captar toda a dimensão do problema. Nomeadamente, a abordagem feita ao eixo económico leva-nos a concluir - de forma errónea pelo que acabei de dizer a respeito do conservadorismo - que quanto mais para a Direita caminharmos, menos economicamente estatista seremos.
Ora, aceitar isto implica aceitar que a influência do Estado sobre a economia se faz exclusivamente por via da posse dos meios de produção ou de mecanismos de redistribuição oficiais. Politicamente a realidade é bastante mais complexa e o intervencionismo conservador atesta-o. Um Estado pode ser fortemente intervencionista sem ter uma única empresa pública nem segurança social nem Educação ou saúde públicas. O Estado pode centrar a sua actuação na protecção das empresas nacionais e no seu fortalecimento face à concorrência estrangeira, manipulação do mercado que qualquer bom conservador aceitará de forma mais ou menos explícita e perante a qual qualquer bom liberal tenderá a arrepiar-se.

Portanto aquele gráfico transmite-nos uma ideia errada se aceitarmos as coordenadas os eixos "sociedade" e "economia". Temos duas alternativas:

  • transformar o posicionamento político de f(sociedade, economia) em f(costumes, propriedade, Estado) - o que pessoalmente considero pouco prático;
  • substituir sociedade e economia por dois valores: liberdade (substituindo a sociedade) e igualdade (substituindo a economia).

O seu a seu dono: fui recolher esta ideia ao artigo de João Cardoso Rosas. E passo a explicar a minha posição, embora quem tiver lido o artigo já possa estar a adivinhar por esta altura a conclusão. Para defender a ideia de que o PS é de Esquerda, o autor referiu as várias políticas deste partido que têm como objectivo a igualdade, embora a igualdade não na perspectiva maximalista do comunismo mas na perspectiva da igualdade de oportunidades. Portanto, numa visão mitigada, moderada, centrista de igualdade. No extremo esquerdo temos as famílias políticas que defendem a igualdade concreta e absoluta; no extremo direito encontraremos enfim aquelas famílias que negarão a igualdade (ou seja, que afirmarão ou que a igualdade põe em causa a propriedade e a liberdade, ou - o que é o mesmo - que a igualdade é um dado adquirido: somos todos iguais em teoria e portanto nenhuma actuação política para gerar igualdade real é legítima).

Qualquer uma das posições que ora referi é compatível com maior ou menor intervenção do Estado, sendo que no entanto ao centro encontraremos políticas mitigadoras da desigualdade real e que visem efectivar a igualdade teórica (ou seja, a todos deve ser dada a oportunidade de competir); à esquerda encontraremos uma negação da competição pela proibição da desigualdade; à direita encontraremos uma negação da competição pelo impedimento prático (que vai a par com a permissão teórica) da competição.
As variações serão por conseguinte produto da nossa vontade de estimular uma maior ou menor dinâmica social, ou seja, uma maior ou menor separação do indivíduo face ao meio envolvente. Pela sua posição central, o liberalismo (nos termos em que o defini no início, por oposição aos anarquistas e aos libertarians) é quem mais individualista é, não só pela defesa da liberdade de costumes, mas porque do ponto de vista socio-económico não aceita nem a sua absorção pela colectividade nem que o seu sucesso seja simplesmente produto do nascimento.

domingo, 7 de outubro de 2007

Energia: vantagens políticas da liberalização económica

Da entrevista a António Costa e Silva retiramos essencialmente as seguintes conclusões:

  1. - Sofremos de grande dependência de um vizinho fortemente duvidoso; essa dependência tenderá, se nada for feito, a agravar-se no futuro.
  2. - A existência de monopólios nacionais no seio da União Europeia, ao invés de defender esses mesmos interesses (argumento utilizado tanto à Esquerda como à Direita - veja-se o caso que recentemente trouxe de Sarkozy) representa um perigo enorme. Um só decisor que não presta contas a ninguém é permeável a manipulação política e a corrupção económica (e as intrigas palacianas sempre foram o forte dos czares).
  3. - A Europa não só tem de, como pode facilmente encontrar alternativas perfeitamente viáveis à dependência face à Rússia. E, cá para nós que ninguém nos ouve, Portugal, pela sua localização e pela sua relação com países como a Argélia, Venezuela ou São Tomé e Príncipe, seria um dos maiores beneficiados.
  4. - A questão energética é o exemplo acabado de como o Estado nacional é uma unidade insuficiente para responder as desafios actuais. Geopoliticamente temos de pensar em termos de grandes blocos (a Europa face à Rússia e satélites, a Europa face ao Magreb, a Europa face à África subsaariana, etc.); economicamente, as grandes companhias estatais que controlam produção e distribuição não protegem os consumidores.
Curiosamente - ou nem tanto - promover a luta entre diferentes empresas de produção e de distribuição poderá ser a melhor forma de vencer o combate contra o senhor Putin.

A Identidade, a Complexidade e a Tolerância

When I think of my country and culture, the first thing comes to mind is the sense of belonging to nowhere. [...] There is no doubt that what provides a lot of conflicts also contributes positively to Turkish culture and distinguishes it from other cultures and countries with its unique mixture between the West and the East.

Ao ler o texto de Eda Sirma lembrei-me (inevitavelmente) de Amin Maalouf, autor do qual já aqui falei mais do que uma vez. Melhor que eu falar dele novamente, será talvez dar um pequeno gosto da sua escrita. Retirei o sumo do seu ensaio Les Identités Meurtrières.

Depuis que j'ai quitté le Liban en 1976 pour m'installer en France, que de fois m'a-t-on demandé, avec les meilleures intentions du monde, si je me sentais "plutôt français" ou "plutôt libanais". Je réponds invariablement: "L'un et l'autre!" Non par un quelque souci d'équilibre ou équité, mais parce qu'en répondant différemment, je mentirais. Ce qui fait que je suis moi-même et pas un autre, c'est que je suis ainsi à la lisière de deux pays, de deux ou trois langues, de plusieurs traditions culturelles. C'est précisément cela qui définit mon identité.
[...]
Moitié français, donc, et moitié libanais? Pas du tout! L'identité ne se compartimente pas, elle ne se répartit ni par moitiés, ni par tiers, ni par plages cloisonnées. Je n'ai pas plusieurs identités, j'en ai une seule, faite de tous les éléments qui l'ont façonnée, selon un "dosage" particulier qui n'est jamais le même d'une personne à l'autre.
[...]
Toutes ces appartenances n'ont évidemment pas la même importance, en tout cas pas au même moment. Mais aucune n'est totalement insignifiante. Ce sont les éléments constitutifs de la personnalité, on pourrait presque dire "les génes de l'âme", à condition de préciser que la plupart ne sont pas innés. Si chacun de ses éléments peut se rencontrer chez un grand nombre d'individus, jamais on ne retrouve la même combinaison chez deux personnes différentes, et c'est justement cela qui fait la richesse de chacun, sa valeur propre, c'est c'est ce qui fait que tout être est singulier et potenciellement irremplaçable.

A perspectiva de Maalouf leva-nos a encarar a complexidade identitária não como uma degeneração e de certa forma nem tanto como uma riqueza, mas como uma inevitabilidade. Riqueza será talvez ter a coragem de reconhecer a diversidade que cada um de nós integra em si. A Turquia tem o enorme peso sobre si de mostrar ao mundo algo que deveria ser evidente: que a tolerância não é um exclusivo dos países de raiz cristã. A sua identidade complexa é precisamente a melhor maneira de atingir esse objectivo.
No Traité sur la Tolérance Voltaire afirmava que os países tolerantes não seriam aqueles em que predominasse uma religião, nem duas, mas onde houvesse tantas que nenhuma conseguisse dominar as outras. Transponhamos essa ideia para os elementos da nossa identidade e teremos uma resposta simples para a difícil questão de como afastar a intolerância - a dos outros, e a nossa.
Muitos supostos defensores da Liberdade no Ocidente estão a adoptar o islamismo como objecto do seu ódio. Isso leva-os a calmamente aceitar a companhia de fundamentalistas cristãos (o que me leva a questionar se eles realmente defendem a Liberdade em si ou apenas porque acham que ela é um atributo ocidental). Esperemos que da Turquia venha a bofetada que merecem.

sábado, 6 de outubro de 2007

Energia, Monopólios e Geopolítica: o braço longo de Putin

Excerto da entrevista a António Costa e Silva, presidente da Partex, no Jornal de Negócios de 3 de Outubro

[...]
A partir de 2011 podem faltar à Europa cerca de 70000 milhões de metros cúbicos de gás por ano, o equivalente ao consumo total da Espanha e França. A Europa importa à Rússia 25% do gás. Daqui a 20, 25 anos, vai importar entre 70 e 75%. Países como a Grécia, Finlândia ou Hungria já dependem em mais de 80% do gás russo. Depois da queda do muro de Berlim, a Europa só passou a olhar para a Rússia. Mas pode sair deste problema, porque há outras alternativas, como a Líbia e o Egipto, países com grandes reservas. E a própria Argélia pode ter mais peso.


- Podemos ficar reféns da Rússia?
Sim, se nada for feito para alterar este percursos. E o problema é que as grandes companhias monopolistas, como as alemãs e as francesas, são os principais aliados da Gazprom e da Rússia, com grandes contratos de fornecimento.


- E depois acontecem situações como a do ano passado na Bielorrússia...
Em que tudo fica bloqueado. Para evitar isso, a Europa tem de criar uma estratégia com vários pilares. Primeiro, uma aliança estratégica com a Noruega, um país que não faz parte da UE, mas que tem grandes reservas de petróleo e gás e está numa luta surda com a Rússia por causa das reservas no mar de Barents, no círculo polar Ártico. Depois, é a aposta na bacia atlântica. Temos grandes pólos de gás na bacia atlântica: Nigéria, Guiné Equatorial, Tinidade e Tobago, Venezuela, Brasil ou Angola e este eixo só funciona em direcção aos EUA e não em direcção à Europa. É uma miopia política grave.


- Como deveria a Comissão Europeia (CE) reagir?
A CE está a tentar seguir uma política correcta, mas não comanda a Europa. Só com pensamento geopolítico unificado se poderá lidar com o problema da Rússia. O pacote energético em discussão, o "unbundling" [separação das redes de produção das de distribuição de gás e electricidade], é crucial, pois só separando redes e aumentando a concorrência é que a Europa se pode defender. Um estudo da CE mostra que entre 1998 e 2006, o preço da electriccidade aumentou cerca de 29% nos países da UE onde havia monopólios a dominar e não havia separação de redes. Nos países onde havia essa separação, só cresceu 6%. A Europa, em termos de energia está prisioneira dos grandes monopólios e da falta de concorrência do sector.

sexta-feira, 5 de outubro de 2007

Ainda sobre as praxes e o sadomasoquismo - explicação

Perversão sexual ("tara") deve, a meu ver, ser considerado tudo o que implique um desrespeito face ao objecto de desejo. Assim, a zoofilia é uma tara porque não podemos dizer que o animal racionalmente, livremente, aceita o acto. O mesmo em relação à pedofilia, etc.. O sadomasoquismo, na dimensão sádica, também pode revestir esse carácter, mas não é líquido que assim seja. A falta de consentimento pode tanto existir entre dois ou mais indivíduos que pratiquem sm como entre indivíduos que pratiquem sexo hetero ou homossexual. Não há nenhuma correlação entre qualquer uma destas práticas por si mesmas e a falta de consentimento.Esta é uma visão puramente neutra do acto sexual; colocar "perversão" antes da definição deste conceito implica fazer um julgamento moral apriorístico que só baralha o jogo, porque o fundamental é o consentimento e a consciência dos envolvidos. Eu poderia definir a praxe como "perversão mediante a qual estudantes, militares e genericamente membros de comunidades de algum tipo prescindem durante determinado período de tempo da sua maturidade, da sua inteligência e, no caso dos praxados, do amor-próprio, com vista a exercer poder sobre recém-chegados ou ser aceite na comunidade". Será esta uma definição isenta? Para mim não.


Quanto à praxe enquanto tradição, reitero duas coisas: eu não defendo tradições. Tão simples quanto isto: je m'en fou para elas. Para mim, não dizem nada. Como indivíduo, eu só me submeto às leis a que sou obrigado (e não sempre se as achar injustas) e principalmente a critérios racionais. O resto, tolero quando muito.As actuais praxes têm a agravante de serem de facto uma tradição inventada há menos de 20 anos. Falando com qualquer pessoa com mais de 40 anos que se tenha licenciado em Lisboa e veremos que é difícil (não quero arriscar impossível) encontrar uma só que se lembre de haver praxes por cá.


Last but not least, os conceitos de "academia" e "vida académica" andam desvirtuados. No dia em que "academia" for conjunto de pessoas que se dedicam às ciências e às técnicas e vida académica for o quotidiano e as práticas desse conjunto de pessoas, então aí estaremos bem. Enquanto "vida académica" for esta imagem pseudo-cool de uma geração que voluntariamente gosta de se encarneirar com fatos de vampiro todas as quintas-feiras, estamos mal.


Reitero, no entanto, que este veneno que agora lancei são puras considerações morais minhas. O objectivo do meu post foi simplesmente demonstrar que é eticamente possível criar uma situação de liberdade entre quem gosta das praxes, da mesma forma que pode haver liberdade para quem gosta de sadomasoquismo. Naturalmente, mais liberdade implica mais responsabilidade. A liberdade de praxar (ou de ser sádico, sendo que o segundo engloba, em sentido lato, o primeiro) implica aceitar voluntariamente limitações a essa liberdade que garantam as condições de possibilidade da mesma, que só existe se tiver correspondência numa liberdade de ser praxado/ser masoquista, ou seja, numa possibilidade de escolha entre ser ou não ser praxado/masoquista.

O dia de todos nós


Enquanto o PSD se recompõe...

O CDS de Paulo Portas renasce. Numa só semana o partido conseguiu ser o único a protestar de forma clara contra a vandalização do cemitério judaico e o único a trazer para debate o problema do papiloma humano, com a defesa por Teresa Caeiro da inclusão progressiva da vacina do colo do útero no Plano Nacional de Vacinação.
Isoladamente, podem não significar muito. Mas se continuam assim, lá por ter descartado Marques Mendes, não estará ainda o PSD livre de perigo.

Contabilizando mortes e definindo regimes: Liberalismo e Socialismo

[...] de que falamos quando falamos de liberalismo? E, note-se, a mesma pergunta será legítima para o socialismo.
Ana Cristina Leonardo, nos comentários do 2+2=5

Podemos tergiversar muito sobre os conceitos, mas a questão é que uma e outra ideologia concretizaram-se em regimes políticos.

O liberalismo, concretizado em regimes políticos, implica economia de mercado, e pode incluir formas de Estado Social (aliás, no RU por exemplo os primeiros soluços de Estado Social foram desencadeados pelos Liberais, ainda os Trabalhistas estavam fora do sistema de rotatividade); para além disso, o liberalismo implica separação de poderes e rule of law, dado que quando os Estados modernos nasceram eram liberais e foi o liberalismo que trouxe estes conceitos.
Quanto a concretizações de Estados socialistas, os únicos que conheço são Cuba, URSS, China (hoje já não, mas em tempos), Europa de Leste, etc..

O que eu pretendi dizer é que podemos dizer que esse não era o verdadeiro socialismo, mas isso é completamente improdutivo. O que interessa é que, concretizado, o socialismo deu naquilo. A questão deve ser colocada: poderia resultar noutra coisa qualquer? Quantos mais milhões de seres humanos queremos usar como cobaias?
Pelo contrário, o liberalismo pode ter muitas manchas no seu percurso. Mas não só a sua forma de organização política é rigorosamente a única que se tem revelado ser justa, como do ponto de vista económico é o único que é compatível com a democracia e que simultaneamente promove a prosperidade e, até, igualdade social. Países como a URSS não eram igualitários. Mais hierarquia que aquela era difícil.

quinta-feira, 4 de outubro de 2007

Bons blogs, bons artigos

Coincidências: no mesmo dia em que li um excelente artigo de João Cardoso Rosas sobre o posicionamento do PS no eixo esquerda/direita, soube que um novo blog, surgido do centro-esquerda. Deixo excertos do primeiro e o texto de apresentação do segundo. Vêm de encontro a muitas coisas que tenho escrito, e não posso deixar de lhes dar a ambos os parabéns (em especial para a Rita).
***

Talvez porque foram os liberais os primeiros a assentarem na margem esquerda da política. Talvez porque a margem esquerda esteve, durante tanto tempo, conotada com o marxismo-leninismo, que, actualmente, já não encontra proletariado para fazer a revolução. Talvez porque o centro-esquerda de hoje oscila entre o piscar de olho aos partidos à esquerda dos PCs do mundo e o abraço ao neoliberalismo que regula o mundo. Talvez porque o partido de Lenine se chamava "social-democrata" e o de Sócrates se chama “socialista”. Talvez por tudo isto, é difícil percebermos e definirmos a esquerda dos nossos dias. Ou não. Talvez a margem esquerda seja tão alargada que permitacontributos diversificados... De Marx a Giddens, passando por Bernstein, Callinicos e Rawls. Faremos, por isso, como fez Hayek, explicando porque não somos (e não devemos ser) conservadores. E, já agora, por que preferimos a margem esquerda da vida.
***
O consenso sobre o “PS de direita” parece generalizar-se. Mas eu não participo dele.Se quisermos dar algum conteúdo à distinção esquerda/direita teremos de pensar na ideia de rectificação das desigualdades. A esquerda é a favor dessa rectificação porque considera moralmente ilegítimas as desigualdade existentes em sociedades hierárquicas, as desigualdades produzidas pelo mercado, as desigualdades de género, etc. A direita, por sua vez, considera que a tentativa para realizar a igualdade protagonizada pela esquerda é contraproducente porque acaba por destruir as tradições que enquadram e dão sentido à vida humana, a espontaneidade do mercado e a própria liberdade individual. [...]
Pense-se nos incentivos à natalidade que entraram em vigor esta semana. Esses incentivos são condicionais em relação ao rendimento dos agregados familiares. [...]
Pense-se noutro exemplo: a reforma do sistema de pensões. O Governo decidiu manter-se fiel ao regime de repartição e não enveredou pelo regime de capitalização privada que era preconizado pela direita. [...]
Outro exemplo ainda: a despenalização do aborto. Quer concordemos ou não com ela por razões éticas, a verdade é que esta medida se insere numa visão rectificativa das desigualdades e, por isso, é tão cara à esquerda. Na prática, o aborto já estava despenalizado para as classes média e alta. [...] Quem não tinha acesso ao aborto seguro eram as classes baixas e são elas as grandes beneficiadas com o novo enquadramento legislativo [...].
Julgo que aquilo que confunde a esquerda do PS – mas também a sua direita – em relação à marca ideológica das suas políticas é uma certa renúncia ao estatismo em matéria económica. Neste domínio, o Governo é um pouco – infelizmente, talvez apenas um pouco – menos estatista do que seria de esperar por parte de um Governo do PS. Mas isso não demonstra que ele seja de direita. Há uma esquerda estatista e uma esquerda liberal. Também há uma direita liberal (que não é apenas sulista e elitista) e uma direita estatista.
João Cardoso Rosas, Diário Económico

As praxes e o sadomasoquismo

Há uns tempos escrevi um post sobre a ideia de direito social e do seu potencial libertador para os indivíduos. A discussão sobre as praxes é para mim o exemplo acabado de como isso é possível.
Antes de avançar, gostava de dizer que pessoalmente não gosto de praxes, acho a ideia deprimente, os trajes académicos são ridículos e toda a ideia de tradições académicas, além de ser falsa (é uma criação de há uns 20 anos atrás, copiada em grande parte - mas não exclusivamente - a partir de Coimbra) fede a reaccionarismo bacoco. No entanto, esse é o meu julgamento moral e não faz para mim sentido impôr os meus particularismos morais ao conjunto da sociedade.
A propósito de uma comparação entre as praxes e Abu Ghraib houve quem estabelecesse o paralelo - acertado, creio - com o sadomasoquismo. Talvez essa ideia deva ser moderada com o reconhecimento de uma realidade que não acontece no segundo caso, que é a de uma desigualdade de condições à partida entre praxantes e praxados. Os praxados estão num sítio novo com pessoas novas - estão isolados. No caso do sadomasoquismo praticado entre adultos as regras são grosso modo conhecidas por ambos. Ainda assim, admitamos a comparação.
Este ano tive acesso a uma declaração da Associação de Estudantes da FEUNL que, creio, é a concretização de uma verdadeira intenção de dar liberdade de escolha aos indivíduos. A praxe não é proibida, mas o desequilíbrio entre as partes é compensado por haver uma instituição que representa as partes (a AE) e que acaba com o tribunal de praxe, ao mesmo tempo que restringe o âmbito das praxes e estipula o estrito direito de cada indivíduo se recusar a participar, total ou parcialmente, sob pena de as praxes serem proibidas na sua totalidade.
O que sucede no sadomasoquismo? Se investigarmos um pouco (é só googlar) descobriremos que os aficionados chegam a estipular códigos de conduta muito sérios a respeito do funcionamento desta prática sexual. Estes códigos normalmente envolvem um desequilíbrio de deveres e direitos favorável à parte mais exposta ao perigo (o masoquista, portanto) que tem sempre a última palavra sobre o que pode ou não ser feito.
Em ambos os casos temos situações em que conseguimos deixar a liberdade para os indivíduos sem proibicionismos moralistas mas sem abandonar também os indivíduos à sua sorte. Quanto a abusos, existem como existirão sempre (não é facto de haver leis que impede a existência de transgressões às mesmas) mas nos casos que os indivíduos não consigam resolver por si há sempre uma outra instância a que recorrer (em última análise, e se a sociedade não conseguir fazê-lo, temos os tribunais).
Tenho também consciência que o caso da AEFEUNL será excepção: provavelmente a maior parte das AE's até é formada por energúmenos que alinham nas praxes mais idiotas; isso não me impede de louvar este caso e de o apresentar como exemplo a seguir.

quarta-feira, 3 de outubro de 2007

Dá para o que quisermos

Qualquer problema económico, em qualquer lugar, sob quaisquer circunstâncias, deve-se sempre à falta de liberalismo.
Vamos alterar as palavras mas manter o raciocínio:"O socialismo não é mau. O facto de sob a sua égide terem morrido dezenas de milhões de pessoas é apenas porque a verdadeira consciência revolucionária não tinha sido atingida."

Coming Out

Há umas semanas eu trouxe o caso de Ehsan Jami e concordei (um pouco a custo, mas entendendo-o na conjuntura holandesa - muito mais liberal que a portuguesa) quando ele dizia que ser um ex-muçulmano é hoje tão mau quanto era ser homossexual há trinta ou quarenta anos.
Sucede no entanto que não é preciso ser-se um muçulmano na Europa (ou em qualquer outra parte do mundo) para se ser atacado por se renegar a religião. Nos EUA os políticos não têm liberdade de descrença, uma liberdade tão importante quando a de crença mas normalmente esquecida e as mais das vezes combatida pelos defensores do "ecumenismo religioso".
É pois triste que seja boa notícia que um congressista americano tenha tido a coragem de fazer o coming out: não, ele não é homossexual; é que nos EUA, pior que ser homossexual é não acreditar em deus. Sair do armário é aqui pois a afirmação do direito de descrer.


Links de interesse
http://www.harvardhumanist.org/
http://www.secular.org/constituency.html
http://www.law.harvard.edu/students/orgs/heathens/about.htm

ATENÇÃO - esta foi mais uma demonstração do temível laicismo radical que pretende retirar às religiões as bases do seu desenvolvimento comunitário. Falando em português, esta afirmação insere-se numa linha de posts meus que visa defender a laicidade do Estado e a secularidade da sociedade para que todos - TODOS - possam crer ou não crer no que entenderem, sem forçarem nem serem forçados a crer ou descrer nem serem forçados a pagar as crenças alheias ou forçarem os outros a pagaram as suas crenças.

Conseguimos ultrapassar a Espanha

Foi um longo e árduo combate, mas ao fim de 29 anos conseguimos novamente ultrapassar a taxa de desemprego de Espanha.

terça-feira, 2 de outubro de 2007

Mahmoud, esse Romeu...

Resposta a um Demente - sobre os "anarco-conservadores-libertarianos"

(dado que no post em causa democraticamente não está a ser possível colocar comentários)

Caro Miguel, devo dizer que lhe vou responder não como se muito burro, mas porque. Assim, da forma mais sintética possível:
Anarco - hipérbole
Conservadores- o que os objectos da expressão de facto são
Libertarianos - neologismo meu, criado pela tradução literal de "libertarian" e que, pela sua aproximação à palavra "marciano" tem de facto altos poderes explicativos do ridículo constituído por este conjunto de bloggers

Mais simples que isto, não há.

Não te matamos, mas tens de te converter


[...] como podem ser toleradas todas as posições religiosas? Isso levaria a que as pessoas que têm posições religiosas que toleram o Aborto, a Pedofilia ou o Homicídio de Infiéis, tenham de ser toleradas.



O autor deste blog afinal é um humanista: apesar de defender que o Estado obrigue todos os cidadãos a guiar-se por uma mesma religião, ele não está a favor do assassinato dos não-crentes.

Que conclusão? Bom, a bem ou a mal, têm de ser convertidos. Não mortos, mas convertidos. Em último caso, manda-se os tipos para as masmorras.

Face a outros tempos, é uma evolução.

Católicos de todo o mundo: a aspirina tem de ir para a sanita


Precisamente o mesmo direito que uma pessoa de outra denominação religiosa tem de se deslocar a um hospital e dizer a um moribundo para este tomar uma dose de morfina e evitar o sofrimento da vida [e os disparates prosseguem].



Portanto, tomar ou não tomar anestesiantes é uma questão religiosa. Ficamos pois a saber que os católicos não se devem furtar aos sofrimentos desta vida e aceitar a obra de deus pacificamente. Portanto, aspirinas, trifenes, benurons e outras obras demoníacas que tais, tem tudo de ser arrasado.

Esperam-se manifestações massivas dos mais virtuosos portugueses em frente das suas farmácias de bairro a exigir a destruição de todos os analgésicos. Aliás, o próprio nome já denota a sua imoralidade: uma coisa cujo nome começa por "anal" só pode ser obra do Perro.


Isto anda tudo ligado pá, ai anda, anda!

Finalmente, um católico a falar verdade

Numa sociedade em que o Estado não tem qualquer directriz religiosa e se submete a legislar segundo os desejos da multidão, o laicismo e o secularismo são consequências lógicas e imediatas. [...] como podem ser toleradas todas as posições religiosas? Isso levaria a que as pessoas que têm posições religiosas que toleram o Aborto, a Pedofilia ou o Homicídio de Infiéis, tenham de ser toleradas, possam agir como desejam e possam espalhar a sua mensagem livremente (o Estado não deve imiscuír-se na religião da sociedade, segundo diz).
Finalmente um católico sério e honesto. Ou seja, completamente intolerante e demagógico, mas essa é a realidade inultrapassável do catolicismo levado a sério (e de qualquer religião levada a sério). O que o senhor bispo fez foi apresentar uma visão light e pós-moderna de um Estado confessional e encobri-lo sob a capa da laicidade. E isso é inaceitável. Ou somos pelo Estado laico (ou seja, neutro) ou não somos.
A comunidade fragmentar-se-ia num multiculturalismo amoral.
É curioso que para o autor do post em causa só haja duas alternativas: ou uma moralidade exclusiva e impositiva ou um estado de não-moralidade. Desde logo, amoralidade é coisa que não existe. Mas nunca é demais lembrar que podemos guiar-nos por uma moralidade racional, e não pelos disparates escritos e reescritos ao longo de 4000 ou mais anos.
O Senhor Dom Manuel Clemente acha que o secularismo e o laicismo são enormes progressos da civilização.
Esta frase está incorrecta. O que o bispo pós-moderno defende é a "laicidade", não o laicismo. Não percebeu? Eu também não. Ou melhor, percebemos os dois.

segunda-feira, 1 de outubro de 2007

Não há um que se aproveite

[...] o laicicismo pretende retirar as ditas condições de desenvolvimento comunitário necessárias à igreja no papel social que se propõe.
Recentemente uma personagem chamada Migas disse que [uma] peça do DN brinda-nos com uma afirmação digna do Igor Caldeira a falar de “anarco-libertarianos” (n'O Demente). Quando eu escrevi aquele texto, até tinha achado que tinha esticado um poucochinho a corda: como os anarcaps e os conservadores andam todos misturados, estava (achava eu) a provocatoriamente tomar a parte pelo todo.
E não é que eu disse uma verdade pensando que estava a dizer um meio-disparate? Pois é. O FMS, um dos melhores exemplos de um anarcap, afinal esquece todo o seu objectivismo quando se trata da religião. Os liberais portugueses somam e seguem. Não há um que sobre.
Deixo uma frase de Ayn Rand, fundadora do objectivismo.
[F]aith and force. . . . are corollaries: every period of history dominated by mysticism, was a period of statism, of dictatorship, of tyranny.
Adenda
Conforme disse aqui eu faria a correcção do que escrevi caso me tivesse enganado e o Filipe mo explicasse. Ele de facto escreveu o seguinte
Não percebo porque este é um assunto de discórdia. É assim mesmo, nem há outra maneira de pôr a coisa.
É na verdade tão simples como isto.
Portanto, concordando com o Luís Lavoura e comigo em como o Estado não deve subsidiar os cultos religiosos. Confesso que permanece a minha dúvida sobre qual o significado de dizer que certo laicismo constitui obstáculo ao desenvolvimento comunitário das igrejas - no entanto, e isso é que é mais importante, ficou esclarecido que a posição do Filipe foi por mim mal interpretada. A minha correcção e as minhas desculpas, portanto.

Intervencionismo Conservador parte II - Comércio livre é para os pobres

Depois de bater na França de Sarkozy, vamos bater um bocado nos EUA de Bush.
Há cerca de dois anos, a administração norte-americama de George Bush decidiu engendrar um plano para tentar salvar a indústria automóvel do país, uma das mais fortes do mundo, mas a sofrer graves reveses com a concorrência europeia, japonesa e sul-coreana - e também com a persistência em colocar nos seus carros motores de grande consumo de combustível.
[...]
O conceito é simples: a indústria automóvel norte-americana comprometeu-se, com a mediação de Bush, a comprar componentes quase em exclusivo às empresas do país, sendo que estas reservavam para si a hipótese de adquirirem parte da produção nos países 'low cost' (China e Índia, principalmente).
[...]
Neste quadro, e faltando apenas que os componentes chineses e indianos "passem a dizer 'made in USA'", o mercado de exportação de componentes para os EUA acabou. "A Iberomoldes tinha um volume de negócios anual com os EUA de 12 a 15 milhões por ano. Em 2006 exportámos um milhão e este ano nada", revela Henrique Neto.
Diário Económico, 1 de Outubro

Os EUA são, ainda mais que a União Europeia, o principal defensor do comércio livre - mas livre deve ser entendido no sentido em que os conservadores entendem a palavra, e não no sentido próprio da palavra (como uma recente discussão demonstrou, os conservadores não se dão muito bem com as palavras). Ou seja, os EUA devem ser livres de exportar e de proibir que os outros possam exportar e os outros são livres de comer e calar.

Ainda sobre o Bispo da Batata

A resposta ao post no Blasfémias, da parte de um leitor:

Vejamos se eu percebi:
laicidade: O estado contribui generosamente para a igreja que não é oficial mas é maioritária. Afinal os crentes formam a grande maioria da população e , por misteriosos motivos, são incapazes de salvaguardar a salvação da sua alma pagando directamente do seu bolso.
laicismo: Radicalismo anti-clerical; perigosa perseguição religiosa onde cada cidadão contribui financeiramente da forma que melhor entende para que a sua igreja/religião cumpra todos os seus objectivos espirituais e mundanos.

Será preciso fazer um desenho?