sexta-feira, 7 de dezembro de 2007

Os tolerantes com os intolerantes, serão realmente tolerantes?

Uma democracia liberal tem que ser (e isto é um contra-senso, eu sei), em certa medida uma ditadura: A ditadura da liberdade. Ou seja, não se pode aceitar no jogo político de uma democracia liberal aqueles que não aceitam o sistema, sob o risco de essa democracia liberal deixar de existir e obrigar quem defende a liberdade a lutar pela força das armas novamente pela mesma.
Esta é uma questão bicuda e que de todas as formas tem duas respostas possíveis, uma no plano (macro)político e outra a nível individual. Ao nível macro, a resposta de John Rawls (Uma Teoria da Justiça, cap. IV-35) satisfaz-me: a limitação dos intolerantes deve dar-se apenas quando se coloca em causa a liberdade social, ou seja, a comunidade política no seu todo ou em alguma das suas partes é prejudicada na sua liberdade. Os intolerantes não têm em si qualquer direito a ser intolerantes, nem sequer têm o direito de protestar se a comunidade for intolerante para com eles: mas a comunidade política tem o dever de só limitar a sua liberdade se a liberdade de outrem for efectivamente limitada (e isto não implica apenas que por exemplo um A bata em B; se A apelar a que B seja atacado, estará já a pôr em causa os princípios de justiça que regem a comunidade).

Outra questão, bastante mais simples, creio, é no plano pessoal. Ninguém pode a todo o momento insurgir-se sempre contra todas as manifestações de racismo, homofobia, machismo, etc, etc, etc.. Isso é certo.
Na blogosfera, por exemplo, entre Insurgente, Atlântico, Portugal Contemporâneo e tantos outros, o número de bloggers com algum relevo que com alguma frequência emitem opiniões (e vou utilizar a palavra que alguns apelidaram de mal educada - eu, concordando com o que li num post da Fernanda Câncio, considero que pior é ser intolerante) asquerosas não deixariam nenhum descanso aos tolerantes (ou seja, aqueles para quem é importante insurgirmo-nos contra manifestações de intolerância, como o racismo por exemplo).

Sucede apenas que é de estranhar o silêncio permanente nuns casos e o alarde permanente sobre outros. Pode até ser que quem esteja calado não concorde inteiramente com essas opiniões. Mas quem partilha o mesmo espaço que esses autores e não se opõe a essas opiniões então de facto quando se cala diz muito a respeito de si próprio.

Isto, em termos genéricos. Em termos concretos, quem apresenta estudos "científicos" nos quais se defende que os brancos são mais inteligentes que os negros é intolerante. E portanto voltamos ao ponto de partida: quem é que é intolerante? Quem não tolera a intolerância, ou quem é intolerante à partida? Poderemos ser individualmente tolerantes perante os intolerantes?

E por que é que esses paladinos do pluralismo só defendem o pluralismo com unhas e dentes quando se trata de uma crítica à intolerância, mas estão "demasiado ocupados" ou "cansados" ou "distraídos" ou qualquer outra coisa para sequer escrever uma brevíssima frase sobre a intolerância racial, sexual, religiosa (excepto se vier do islamismo), etc.?
É aqui que eu estabeleço uma fronteira - um cordão sanitário. Não tenho rigorosamente nada que ver com essa gente. Homens como Pacheco Pereira, que jamais defendem os direitos das minorias raciais ou sexuais, que inclusivamente comparam canas de milho a imigrantes (com preferência pelas primeiras, naturalmente) e que depois vêm clamar pelos direitos, liberdades e garantias de homens como Mário Machado - esse tipo de gente não é a minha gente. Cheira a podre o seu pluralismo: tresanda a carcaça ideológica com mortalha nova.

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