Apesar da falta de tempo que tenho tido, não queria deixar passar as eleições no PSD sem dizer que Pedro Passos Coelho é provavelmente a única esperança que tenho, de momento, para Portugal. E digo isto sem omitir que, provavelmente, mesmo que ele ganhasse, ainda assim não me sentiria muito inclinado a votar PSD (tudo dependendo das suas propostas em matéria social).
Manuela Ferreira Leite tem a minha simpatia por não ser irresponsável: a questão do défice é crucial. E quem quer que ponha de parte o combate pelo equilíbrio (e, desejavelmente, por um pequeno excedente que permita pagar alguns desvarios das últimas décadas) orçamental não pode ser sério. Diga-se, no entanto, que Ferreira Leite fez parte do último governo de Direita - do qual saímos com uma situação orçamental em nada distinta daquela que tínhamos em 2002.
O problema maior da candidata está na célebre vida para além do défice. Que traz ela de novo? Nada. Que projectos apresenta para o país? Nenhum. Se os tem, a mensagem não passou. E isso já é significativo que baste.
Omito Patinha Antão, que claramente não vencerá. E Santana Lopes, em relação a quem é preciso ser muito destrambelhado ou muito extremadamente direitista para simpatizar. Resta-nos Passos Coelho.
Verdade que ainda não se percebeu em concreto a que liberalismo se refere ele. Mas promete pôr a social-democracia na gaveta, pelo menos ao nível discursivo. Na prática, a social-democracia é o espaço do PS. E mesmo esse, com Sócrates, está vacilante entre tiques estatistas (e portanto socialistas) e uma verdadeira vontade de reformar o país (num sentido liberalizador). Ora é nessa fusão socialismo/liberalismo que vive a social-democracia, da mesma forma que é numa osmose liberalismo/socialismo que vive o liberalismo social*.
Em todo o caso, Pedro Passos Coelho promete não deixar rigorosamente tudo na mesma. Mesmo que as propostas mais radicais fiquem pelo caminho, o consenso mole sobre o Estado, a economia e os costumes pode sofrer algumas guinadas. Em particular no plano económico, estamos a precisar delas. Tudo o que nos aproxime a nível fiscal ou burocrático dos países mais liberais do continente europeu (que mantêm taxas de crescimento, apesar da crise, apreciáveis) será bem vindo. É que, se há tanta coisa má na liberalização económica, não se percebe como os portugueses recomeçaram a emigrar - e não raro para países em que vários tabus foram quebrados.
O PS reforma, mas não reforma o suficiente. O PSD com Passos Coelho poderá reformar exactamente o necessário para invertermos o ciclo de entropia em que entrámos há cerca de oito anos.
Bom, se a minha confiança no candidato é tanta, porquê furtar-me a votar no seu partido, caso ele vença? Portugal é um país de fidalgos. Num cenário como o presente, o Estado é um bom suporte para toda essa fidalguia. Num cenário de liberalização da economia, nada nos diz (bem pelo contrário) que algo mudasse; deixava de ser o Estado, passavam a ser as empresas privadas (como de resto já acontece).
O governo de Sócrates, como é natural, não foge à regra e mantém o mesmo sistema de interesses, partilhado pelo PSD e pelo PP. Nada muda a nível estrutural. Mas tem desenhado políticas consistentes que não abandonam os mais desfavorecidos e a classe média à sua sorte. A intervenção ao nível do salário mínimo é disso o melhor exemplo. O aumento ao ritmo de 5% ao ano tem sido o único garante de aumento salarial para uma faixa crescente de população. De facto, a classe média-média (600 a 900 euros brutos mensais) quando não perde remuneração (por mudar de emprego) mantém-se no mesmo emprego - e com o mesmo salário - anos a fio.
Qualquer política dirigida para a protecção dos mais desfavorecidos (e eu como bom rawlsiano, tenho o princípio de justiça de que qualquer desigualdade é justa apenas se no sentido de favorecer o mais desfavorecido) tem de dar ao SMN um lugar de destaque.
Ora, o que conhecemos de governos PSD são taxas de crescimento extremamente baixas (metade das do PS). E nada nos diz que com Passos Coelho fosse diferente.
Numa das entrevistas que deu, afirmou que o Estado tinha naturalmente um papel fundamental na protecção social. O problema disto é que não explicou como. Não era preciso elaborar muito, apenas explicar em duas ou três questões o que pretendia fazer. No emprego, nas políticas sociais, etc.. Porque eu acredito que não é preciso o Estado ser omnipresente para proteger os mais fracos. E que há formas não estatizantes de gerar mobilidade e até coesão (no sentido de diminuição de diferenças entre ricos e pobre, escandalosamente elevadas em Portugal) sociais. Mas é preciso percebermos se esse é um tema que realmente preocupa quem quer governar, ou se é apenas uma pergunta a que têm de responder de chofre porque já é da praxe. Esta não é uma questão de caridade. É uma questão de justiça. É uma questão ideológica e é também uma questão moral.
Portugal precisa do liberalismo como do pão para a boca. Mas também precisa que esse liberalismo não seja o mesmo conservadorismo de sempre, sempre mascarado para não dizer o seu nome (ora socialismo, ora social democracia, ora liberalismo, conforme as modas da década), mas que seja um liberalismo progressista, social.
Caso Passos Coelho vença o PSD e depois quebre muitos dos tabus que enfermam a esquerda e a direita portuguesas, creio que a sua marcha para vitória em 2009 será imparável. Não creio contudo que isso venha a acontecer. Manuela Ferreira Leite será a mais provável vencedora. Enfim, uma mulher a liderar um partido. Mas vai ser apenas uma senhora para gerir a crise - não sair dela.
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A esse respeito, ver este teste: European Political Ideologies, e em particular as definições de Liberal Social e Social Democrata:
My #1 is:
You are a social liberal. Like all liberals, you believe in individual freedom as a central objective - but you believe that lack of economic opportunity, education, healthcare etc. can be just as damaging to liberty as can an oppressive state. As a result, social liberals are generally the most outspoken defenders of human rights and civil liberties, and combine this with support for a mixed economy, with an enabling state providing public services to ensure that people's social rights as well as their civil liberties are upheld.
My #2 is:
You are a social democrat. Like other socialists, you believe in a more economically equal society - but you have jettisoned any belief in the idea of the planned economy. You believe in a mixed economy, where the state provides certain key services and where the productivity of the market is harnessed for the good of society as a whole. Many social democrats are hard to distinguish from social liberals, and they share a tolerant social outlook.