Transcrevo na quase totalidade o texto de Vasco M. Barreto no editorial do jornal Metro de hoje. Subscrevo-o integralmente.
O Papa Bento XVI acabou por recusar um convite, após protestos de académicos da universidade La Sapienza, em Roma, na sua maioria cientistas, contra um seu anunciao discurso a ser proferido na universidade. Nesta história, descrita como um sinal da intolerância dos laicos, há uma irresistível sucessão de ironias enfiadas umas nas outras como matrioskas russas.
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Ratzinger, em 1990, então ainda responsável máximo da Congregação para a Doutrina da Fé (que sucedeu à Inquisição), proferiu um discurso sobre a condenação de Galileu que os físicos da Sapienza consideraram agora um insulto. Diz Ratzinger que até ao século XVIII poucos deram importância ao julgamento de Galileu, mas que no século seguinte o caso ascendeu a “mito do iluminismo” […]. Com base em três citações, Ratzinger defende depois que tal visão já não faz sentido, pois há quem pense que, na ausência de um referencial absoluto, ter o Sol ou a Terra ao centro é uma questão de gosto pessoal, quem ache justa a decisão da Inquisição e quem veja Galileu como o tetravô da bomba atómica. O actual papa, com a ressalva de não pretender fazer destas citações a defesa da Igreja, arrumou a questão dizendo que a dúvida se instalou na ciência. […]
Ora bem, o crítico do relativismo na moral, surge aqui como fã da Teoria da Relatividade na Física (primeira ironia), mas parece esquecer que foi o próprio Galileu a propor a noção de relatividade, que Newton e depois Einstein explorariam (segunda), preferindo uma alusão ao diabolismo da ciência e nenhuma a Giordano Bruno, um herege reduzido a cinzas pela Igreja (terceira), tudo contribuindo para um exercício de retórica com conclusões feitas a partir de citações picarescas e omissões graves, sendo ele tido como um intelectual reputadíssimo (quarta). […]
O sentido do seu discurso de 1990 é inequívoco e um bom exemplo de como a Igreja lida mal com o seu passado. […] Ver este Papa como a vítima nesta história é a altíssima ironia (a quinta). […]
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Ratzinger, em 1990, então ainda responsável máximo da Congregação para a Doutrina da Fé (que sucedeu à Inquisição), proferiu um discurso sobre a condenação de Galileu que os físicos da Sapienza consideraram agora um insulto. Diz Ratzinger que até ao século XVIII poucos deram importância ao julgamento de Galileu, mas que no século seguinte o caso ascendeu a “mito do iluminismo” […]. Com base em três citações, Ratzinger defende depois que tal visão já não faz sentido, pois há quem pense que, na ausência de um referencial absoluto, ter o Sol ou a Terra ao centro é uma questão de gosto pessoal, quem ache justa a decisão da Inquisição e quem veja Galileu como o tetravô da bomba atómica. O actual papa, com a ressalva de não pretender fazer destas citações a defesa da Igreja, arrumou a questão dizendo que a dúvida se instalou na ciência. […]
Ora bem, o crítico do relativismo na moral, surge aqui como fã da Teoria da Relatividade na Física (primeira ironia), mas parece esquecer que foi o próprio Galileu a propor a noção de relatividade, que Newton e depois Einstein explorariam (segunda), preferindo uma alusão ao diabolismo da ciência e nenhuma a Giordano Bruno, um herege reduzido a cinzas pela Igreja (terceira), tudo contribuindo para um exercício de retórica com conclusões feitas a partir de citações picarescas e omissões graves, sendo ele tido como um intelectual reputadíssimo (quarta). […]
O sentido do seu discurso de 1990 é inequívoco e um bom exemplo de como a Igreja lida mal com o seu passado. […] Ver este Papa como a vítima nesta história é a altíssima ironia (a quinta). […]
Para mais ler sobre o assunto, recomendo http://memoria-inventada.weblog.com.pt/.
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