sexta-feira, 14 de setembro de 2007

Eu é mais SMS's

Confesso que acho de mau gosto (para não dizer contra-producente) ter como sigla a designação de um serviço de mensagens, embora compreenda que isso dá um ar modernaço à coisa, o que cai sempre bem. A menos que pela frente se tenha um tecnófobo que passou demasiado tempo a ler Orwell, Huxley ou Bradbury e se preocupa em excesso com os limites que a técnica impõe à liberdade humana, como eu; de resto, sendo eu um simpatizante de Bayrou e do seu MoDem, também não tenho moral para criticar os nomes tecnocratistas de outros movimentos.


Reconheço alguns méritos no MMS, o movimento, não o serviço de mensagens, bem entendido. No entanto, não deixa de haver muita coisa que nele me causa comichões. Não é preciso ler o manifesto ou as propostas do movimento - a mim basta-me ler isto: Eduardo Correia garante que o partido não pertence à esquerda, direita ou centro, considerando estes conceitos de «fragmentadores». Como solução, para o MMS e Portugal, garante ser necessária «coesão» e «olhar em frente» para fazer «grandes alterações» no nosso país. (PortugalDiário)
Tenho dificuldade em imaginar frase mais salazarenta que esta, tão própria de um país habituado aos consensos, ora moles porque calados, ora duros se alguém anuncia que discorda. Uma mentalidade do anti-político, aquele que alterna a devoção religiosa a um político autoritário (Salazar, Cavaco, Sócrates - é uma linhagem de várias gerações) com a crítica inconsequente própria do treinador de bancada (eles são todos uns malandros, esses políticos).

Confesso - quem quer que me diga que não gosta de teorias, não liga a ideologias e o que quer é trazer "unidade" ou "coesão" tem a minha desconfiança imediata. O sonho de todo o candidato a ditadorzeco é acabar com todas as utopias, excepto a dele, claro está, dado que é a única que é verdadeira de verdade.

Algumas das propostas vão bem neste sentido, como a defesa de círculos uninominais e uma redução drástica do número de deputados. Curioso, delicioso, como cada proposta mais radical surge sempre matizada com um espírito conciliatório. Por exemplo, a proporcionalidade (que é inexistente em sistemas baseados em círculo uninominais) deve ser "corrigida" com acerto relativo à percentagem de votos globais, de forma a garantir que todos os votos têm o mesmo valor. E acertar como, se os círculos são uninominais? [Criar um sistema como o alemão? Mas isso não está na proposta...]

Uma das coisas com as quais concordo é uma redução drástica do número de autarquias. Até o número me parece razoável. Ao invés de se estar a criar um sistema intermédio entre o município e o Estado, devia-se seguir a lógica seguida no século XIX, diminuindo o número de concelhos e reforçando o seu poder.

Noutros campos o que há é pura cobardia. A frase (seca, vazia de sentido) Reformulação da lei da greve. é clara no sentido em que é óbvio que o pretendido é diminuir as possibilidades de haver greve, no limite proibi-la por completo. Não tenho nada a opôr a essa discussão (ou seja, acho legítimo que a todo o momento se questione todas as instituições e a sua legitimidade, independentemente da minha posição a respeito dessas instituições). O que acho é que deve haver coragem para admitir o que se pretende. Isso é o mínimo que se pode pedir a um partido ou a um movimento político.

Outras propostas são constitucionalmente duvidosas. Não sou jurista, mas os resquícios das minhas aulas de Direito Constitucional fazem-me duvidar da possibilidade (legal, pelo menos) de algo deste tipo: Proposta de composição de governo é apresentada antes das eleições e como tal vai a votos. O problemático aqui é a chancelarização dos regimes políticos e a desparlamentarização que a complexificação do Estado Providência e a mediatização da actividade política geraram. A esmagadora maioria das pessoas vota a pensar que vota num governo, ou até num primeiro ministro. A questão é que nas legislativas nós estamos apenas a votar numa lista partidária. Será de acordo com os resultados que depois se negociará a composição do governo. Não estamos habituados à formação de coligações, e por isso o espírito compromissório não faz parte da nossa cultura política. Aliás, a negociação de alianças pós-eleitorais é muitas vezes apresentada como uma traição aos eleitores. Portanto, esta proposta ou não é mais que um compromisso do movimento em agir dessa forma (o que implicaria que não admitiria em momento algum fazer coligações) ou então é uma proposta de revolução constitucional: ou tornando o regime presidencial e acabando com o cargo de PM, ou criando um sistema inovador em que os cidadãos votariam três vezes: para o PR, para o Governo e para a AR. Dica minha - o resultado que o voto diferenciado nos órgãos executivo e legislativo tem tido nos municípios não é muito animador.

Há, depois, outras coisas. Também modernaças, como o Movimento em causa, mas também um pouco cómicas, como a análise SWOT aplicada a Portugal. Esta espécie de imperialismo conceptual que cada nova moda impõe no plano político começa a ganhar mofo. Noutros tempos, o materialismo dialéctico versão vulgata servia para tudo; agora, são as vulgatas do managerialismo. Que outras iguarias nos trará a História a seguir? Mal posso esperar.

1 comentário:

Anónimo disse...

"Confesso - quem quer que me diga que não gosta de teorias, não liga a ideologias e o que quer é trazer "unidade" ou "coesão" tem a minha desconfiança imediata. O sonho de todo o candidato a ditadorzeco é acabar com todas as utopias, excepto a dele, claro está, dado que é a única que é verdadeira de verdade."

CLAP CLAP CLAP!!!!!

Nem mais, não conseguiria dizê-lo melhor!