segunda-feira, 3 de setembro de 2007

Malaparte, os Totalitarismos e a Homossexualidade

Enquanto googlava em busca de uma associação que em tempos vi, brasileira se não me engano, e que fundia nazismo e comunismo, encontrei este fascinante excerto de Curzio Malaparte

Depois de qualquer guerra, depois de qualquer revolução, tal como depois de uma fome ou de uma epidemia, sabe-se que os costumes decaem. Nos jovens, a corrupção dos costumes é tanto um facto moral quanto fisiológico e confina facilmente com a anormalidade. O seu aspecto mais frequente é a homossexualidade (...)Desta vez, contudo, a corrupção dos costumes na juventude europeia tinha precedido e não seguido a guerra, fora um anúncio, uma premissa da guerra, quase uma preparação para a tragédia da Europa, não uma consequência desta. Já muito antes dos dolorosos acontecimentos de 1939, parecera que a juventude europeia obedecia a uma palavra de ordem, era vítima de um plano, de um programa há muito preparado e dirigido com frio cálculo por um espírito cínico. Poder-se-ia dizer que existia um Plano Quinquenal da homossexualidade para corrupção da juventude europeia. Certo ar equívoco nos modos, nas atitudes, nos ditos, no tom das amizades, na promiscuidade social entre jovens burgueses e jovens operários, certo conluio entre a corrupção burguesa e a corrupção proletária, eram fenómenos já dolorosamente notados muito antes da guerra, especialmente na Itália – onde em certos círculos de jovens intelectuais e artistas, principalmente pintores e poetas, se fazia pederastia e se supunha estar a fazer comunismo – e já denunciados à opinião pública por observadores, por estudiosos, e até por políticos geralmente desatentos aos factos alheios à vida política.O que acima de tudo me surpreendia era o facto de tal corrupção dos costumes juvenis, tanto na classe burguesa, como na classe proletária (...) se verificar com o pretexto do comunismo, como se a inversão sexual, mesmo não consumada, mas só mimada, representada, fosse uma iniciativa indispensável às ideias comunistas. E já várias vezes perguntara a mim mesmo – pois a questão parecia-me de fundamental importância – se isso sucedia espontaneamente, por íntima corrupção moral e fisiológica, como reacção aos costumes, aos modos, aos preconceitos, aos moribundos ideais burgueses, ou se em consequência de uma subtil, cínica e perversa propaganda comandada de longe e apostada em dissolver o tecido social europeu, na previsão do que os espíritos fracos do nosso tempo saúdam como a grande revolução da idade moderna. (...)Os invertidos disseminados pela Europa inteira, e naturalmente também na Alemanha e na URSS, haviam demonstrado ser elementos preciosíssimos para os serviços de informação ingleses e americanos, tendo realizado, desde o início da guerra, um trabalho político e militar especialmente delicado e perigoso. Os invertidos, como se sabe, constituem uma espécie de confraria internacional, uma sociedade secreta governada pelas leis de uma amizade terna e profunda, que não está à mercê das fraquezas e da proverbial inconstância do sexo. (...)
Curzio Malaparte, "A Pele" (cap. V), Edição Livros do Brasil, Lisboa (tradução de Alexandre O'Neill).
É preciso compreender algo que vai ao encontro do que eu já antes disse no comentário ao post do Rouxinol: Malaparte foi membro primeiro do partido fascista italiano (de facto, participou na tomada de poder) e depois da guerra aderiu ao partido comunista. A sua questão está menos na defesa de fascismo ou do comunismo, mas no amor ao ódio: na defesa do totalitarismo, qualquer que ele seja. Se somarmos a este percurso político este excerto, ficamos com um quadro bastante interessante não só da pessoa, mas do que são os partidos comunistas.

PS - sobre esta ideia
Os invertidos disseminados pela Europa inteira, e naturalmente também na Alemanha e na URSS, haviam demonstrado ser elementos preciosíssimos para os serviços de informação ingleses e americanos, tendo realizado, desde o início da guerra, um trabalho político e militar especialmente delicado e perigoso
É curioso como ela é tão parecida com outras, como as divulgadas pelo macarthismo.

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